M-O-N-A

Problemática central do Inventário



Em 2019, a Prefeitura Municipal iniciou um projeto de intervenção no Largo, denominado de “requalificação urbana”. A ação foi resultado de uma parceria com a Associação Viva o Centro que recebeu a doação de recursos dos patrocinadores e administrou as etapas da obra. O projeto ficou a cargo do escritório de arquitetura Triptyque e a iniciativa contou ainda com o apoio do consulado da França e da Câmara de Comércio França-Brasil.

A imagem ilustrativa do projeto, conforme se vê a seguir, deixa claro o caráter gentrificador do projeto, uma vez que se projeta substituir o uso socialmente diversificado, uma característica sempre presente nesse território, por um novo público homogêneo do ponto de vista da classe social.
Mapa ilustrado Montagem crítica ao projeto de intervenção no Arouche. Fonte: Coletivo Arouchianos, 2019

Nesse sentido, o Inventário Participativo LGBTQIA+ da região do Arouche se articula com iniciativa anterior semelhante, o Inventário Minhocão Contra Gentrificação (Repep, 2019), buscando um olhar crítico em relação às iniciativas público-privadas voltadas à promoção de mudanças sociais no território com a exclusão dos grupos sociais mais pobres. Essa crítica também esteve presente nas ações do Coletivo Arocuhianos LGBTHQIAPD+ que, entre as ações, reivindicou audiências públicas participativas para debater o projeto de reforma e, em parceria com a Casa da Lapa, realizaram intervenção artística e política com fotos de pessoas LGBTQIA+ nos tapumes das obras no Largo do Arouche. Assim sendo, o Inventário Participativo é um instrumento para a produção de conhecimento sobre os usos e formas de apropriação do espaço público que se deram historicamente, assim como os atuais (Iphan, 2016). Essa forma de entendimento do patrimônio ocorre a partir da noção de referência cultural que permite compreender a dinâmica sociocultural do território, colocando em destaque a forma como os grupos sociais que moram, trabalham ou usam aquele espaço compreendem esse patrimônio cultural.

Como diz Maria Cecília Londres Fonseca (2000), o trabalho com a noção de referências culturais significa tomar os grupos sociais como intérpretes do patrimônio e não meramente como informantes. Significa compreender, como afirma Ulpiano B. de Meneses (2012) que o ventre gerador dos valores atribuídos ao patrimônio são os grupos sociais, cabendo ao estado o papel de reconhecimento desses valores.

O Inventário, como uma ferramenta de produção de conhecimento sobre o patrimônio cultural, foi tomado como uma estratégia para a criação do Museu do Território na região do Arouche, permitindo organizar e elaborar ações voltadas à musealização do espaço. Assim, surge M.O.N.A - Museu da Ocupação e das Narrativas do Arouche LGBTQIA+ como estratégia de preservação da memória e valorização das referências culturais identificadas, apresentando-se como instrumento de luta, afirmação cultural e política. É mais uma possibilidade para grupos disputarem o direito à cidade e resistirem às frequentes tentativas de apagamento histórico.



Mapa ilustrado Imagens no tapume das obras no Largo do Arouche. Fonte: CCI França Brasil.

Mapa ilustrado Intervenção no tapume das obras do Largo do Arocuhe com imagens do Famílias no Arouche, projeto de documentação fotográfica e audiovisual de ocupantes LGBTQIA+ do Arouche. Fonte: Coletivo Arouchianos, 2019.

Mapa ilustrado Batismo do “Largo da Diversidade” no Largo do Arouche. Fonte: Coletivo Arouchianos, 2019.

Confira um mini documentário babadeiro desenvolvido pelo coletivo @Casadalapa com Coletivo Arouchianos, registrando o amor, a existência, a resistência, o baphos e a ferveção no #LargoDoAroucheLGBTHQIAPD+. (R)existir - Quem ocupa existe. O mini-documentário é um recorte do projeto #FamíliasNArouche, feito como mobilização contra as narrativas da Prefeitura de São Paulo em Ação de Requalificação do Arouche.





Referências bibliográficas

FONSECA, Maria Cecília Londres. Referências Culturais: Base para novas políticas de patrimônio. In: IPHAN. Inventário Nacional de Referências Culturais: Manual de Aplicação. Brasília: IPHAN/ Minc/DID. 2000.

IPHAN. Educação Patrimonial: Inventários Participativos: Manual de Aplicação. Brasília-DF: IPHAN, 2016.

MENESES, Ulpiano T. Bezerra de. O campo do patrimônio cultural: uma revisão de premissas. In: Fórum Nacional do Patrimônio Cultural: Sistema Nacional de Patrimônio Cultural: desafios, estratégias e experiências para uma nova gestão, I, Anais[...]. Brasília: Iphan, 2012, p. 25 a 39.

REPEP. Dossiê do Inventário Participativo Minhocão contra gentrificação. São Paulo, 2019. Disponível em: bit.ly/minhocaocontragentrificao

REFERÊNCIAS CULTURAIS IDENTIFICADAS


Relação das referências culturais

As 40 referências culturais identificadas foram: Arraiá Comunitário LGBTHQIAPD+ Arouchianos, Atividades Culturais, Carnaval De Rua, Natal Comunitário LGBTHQIAPD+ Arouchianos, Centro De Referência E Defesa Da Diversidade Sexual Brunna Valin (CRD), Coreto, Delegacia Seccional De Polícia Centro,UBS Santa Cecília, Arte De Rua De Resistência, Atos Eventos Dominicais Arouchianos, Blocos LGBTQIA+, Pajubá, Performance Drag e Transformista, Publicações Marginais, Teatro De Grupo, Aparelha Luzia, Café Vermont, Circuito Dos Bares, Baladas E Restaurantes, Circuito Das Saunas E Cinemas, Circuito De Acolhimento E Saúde, Ferro’s Bar, Geledés: Instituto Da Mulher Negra, Largo Do Arouche, Museu Da Diversidade Sexual, Ocupação Em Arte E Cultura LGBTQIA+, Praça Da República, Ruas De Trabalho,Sindicato Dos Artistas, Sindicato Dos Jornalistas, Calendário LGBTQIA+, Chichá, Memória Viva, Estátua Amor Materno, Estátua Depois Do Banho, Estátua Índio Caçador, Estátua Luiz Gama, Namoradeira, Associativismo Comunitário, Conhecimentos Da Montagem Tranformista E Drag, Famílias LGBTQIA+

Relação das referências culturais

O método de Inventário Participativo do Iphan (2016) organiza as referências culturais em 5 categorias: Celebrações, Formas de Expressão, Lugares, Objetos e Saberes. As categorias são tanto formas de organização como possibilidades de compreensão apurada dos significados e sentidos atribuídos às referências culturais. As categorias também estão sujeitas ao tecido social, onde as referências estão enraizadas, portanto são possíveis outras maneiras de interpretar as culturas. Como o método de Inventário Participativo do Iphan permite alterações, outras 3 categorias foram incorporadas no Inventário do Arouche LGBTQIA+: Edificações, Marcadores de Tempo e Natureza. A categoria Edificações está presente na experiência do Inventário Nacional de Referências Culturais, também do Iphan, e são imóveis que independentemente de sua qualidade arquitetônica ou artística são valorados por suas significações históricas, representações sociais e narrativas que conservam em sua forma construída. Já a categoria Marcadores de Tempo trata de eventos representativos da memória que situam os grupos no tempo e no espaço, diferenciando-se de Celebrações por serem eventos únicos e sem intenção de repetição. Por fim, a categoria Natureza compreende dinâmicas culturais atreladas à existência da natureza e cuja preservação depende de fatores biológicos e climáticos.

Fichas das categorias do patrimônio cultural utilizadas no Projeto

Celebrações: 4

Edificações: 4

Formas de Expressão: 7

Lugares: 14

Marcadores de Tempo: 1

Natureza: 2

Objetos: 5

Saberes: 3

Total de fichas de referências culturais produzidas: 40

Nome dos entrevistados

As entrevistas foram realizadas em dois momentos distintos, neste Inventário Participativo do Arouche LGBTQIA+ e no Inventário Participativo Minhocão Contra Gentrificação da Repep. As pessoas entrevistadas em 2022 foram: Fernanda Frazão, Victória Principal, Eduardo Luis, Adriana Arco Íris, Ghe Santos, Cícero de Oliveira, Thais Azevedo, Diana Pequeno, Neon Cunha, Katrevosa, Helcio Beuclair, Maria Vitória do Nascimento, Anderson Sousa dos Santos. As pessoas entrevistadas entre 2016 e 2017 pela Repep foram: Alexia Twister, Chico Tchello, Hilton Have, Leila Stungis, Julian, Luana, Rodrigo Roberman Lima, Sheila Muller, Don Valentin, Ginger Moon, Miss Biá, Darbi Daniel, Ivana Wonder. Pela Repep também foram elaboradas entrevistas informais. Dessas entrevistas, selecionamos para o Inventário do Arouche os relatos das conversas com: Bia, Lilian, Veronica, Bruna, Marcelly, Loren, Bruna, Jenifer, Paloma, Paula, Melissa, Valéria Rodrigues, Carol, Gabriel, Lucas, Jaqueline, Kananda, Caíque, Jhonathan e Jefferson, Jéssica da Conceição, Rute Esteves, Jean Grey, Agatha, Wilson, Matheus Ribeiro Marques, Diego Simpson, Ricardo Silva, Stephane.